Além da perda de paladar e olfato: as outras sequelas da Covid-19

Dificuldade de atenção, perda de memória e dores nas articulações também são comuns durante e/ou após a doença. Especialistas comentam sobre o assunto
Após mais de um ano de pandemia, muito se sabe sobre o coronavírus. Mesmo assim, novidades sobre o vírus surgem a todo instante. É comum pacientes relatarem perda de olfato e paladar como sintoma da doença, que permanece após o período de infecção e pode perdurar até por um ano. Mas, muito além disso, tem se observado que as sequelas da infecção também prejudicam as articulações e causam alterações cognitivas e comportamentais.
Essas consequências são comumente relatadas por pacientes com a chamada “Covid longa”, uma condição que afeta pessoas infectadas com coronavírus por semanas ou meses. Um levantamento feito pelo Instituto do Coração (InCor) mostrou que 80% dos pacientes recuperados de Covid tiveram dificuldade de atenção, perda de memória e problemas de compreensão. Outra consequência detectada foi a diminuição da capacidade de coordenação motora.
(Foto: Sasun Bughdaryan/Unsplash)
Além disso, segundo um levantamento de pesquisadores de universidades dos Estados Unidos, do México e da Suécia, com base em estudos com 48 mil pacientes, um em cada cinco pacientes com esse tipo da covid sofre com dores nas articulações, e um em cada dez, com dores musculares.
Perda de memória
Alterações cognitivas e comportamentais têm sido sequelas ligadas à Covid-19, com diversas teorias e pesquisas em andamento, a fim de compreender as causas, a melhor forma de tratar e prevenir. “Muitos pacientes relatam que, após o período de infecção, geralmente a partir da quarta semana, ficam mais ‘aéreos’, ‘desatentos’ e ‘esquecidos’, com sensação de ‘cabeça pesada’, ‘cabeça vazia’ ou ‘lentidão’ no pensamento”, conta André Reis, neurologista do Hospital Anchieta de Brasília.
Estes são sintomas que traduzem efeitos sobre atenção, memória e funções executivas, como velocidade de raciocínio, capacidade de organização e planejamento. Eles podem durar meses e não apresentam correlação direta com a gravidade dos sintomas da infecção. “Os pacientes queixam-se principalmente de dificuldade de memorização, redução da concentração, confusão de pensamentos e dificuldade de realizar atividades cognitivas como antes. O termo ‘brain fog’ tem sido utilizado atualmente para descrever estes sintomas”, explica Reis.
Alguns medicamentos já conhecidos têm sido utilizados para minimizar efeitos cognitivos sobre pacientes que apresentam queixas relevantes nesse âmbito, como antidepressivos com ação sobre memória e atenção. Mas ainda é necessário um maior período de observação, tanto para os sintomas quanto para as intervenções que vêm sendo propostas. “Portanto, o acompanhamento médico desses sintomas é fundamental”, esclarece o neurologista.
Dores nas articulações
Ortopedistas e fisioterapeutas têm se deparado, diariamente em seus consultórios, com pacientes que, após infecção por Covid-19, relatam dores nas articulações, principalmente nos joelhos, cotovelos e tornozelos. “O tratamento com corticoides recomendado para pacientes com Covid, o repouso prolongado e a falta de atividades físicas causam sarcopenia (enfraquecimento muscular) podem gerar até osteoporose, com dores articulares crônicas principalmente na coluna, lombar e joelhos. Nos pés observamos fascite plantar pela falta de alongamentos”, alerta o ortopedista Henrique Mansur, especialista em pé e tornozelo.
Um estudo, feito por pesquisadores de Cingapura com 294 pacientes internados com covid-19, aponta que manifestações musculoesqueléticas generalizadas acometem 50% dos hospitalizados, a exemplo de mialgia (37,5%), artralgia (5,7%) e dor nas costas (6,8%). Segundo o ortopedista Henrique Mansur, a infecção causa, diretamente, mialgia e neuropatias.
(Foto: Unsplash)
Tratamentos disponíveis
Por ser uma doença nova, não existe ainda um protocolo de tratamento. A reabilitação dos pacientes é feita por meio da observação das necessidades e limitações de cada indivíduo. No caso em que há prejuízos neurológicos, o Dr. André explica que é utilizado “o princípio de qualquer reabilitação cognitiva”.
“Buscamos o controle de fatores externos que pioram a memória, como emocional abalado, comorbidades descompensadas, retirada ou redução de dose de medicamentos que possam diminuir a atenção concentração e o cognitivo no geral. Também utilizamos medicamentos que ajudam a manter concentração, como alguns antidepressivos que têm esse efeito paralelo”, relata o médico. O treinamento cognitivo também faz parte do tratamento comumente desenvolvido nesses casos.
Esse treinamento consiste em, basicamente, aprender coisas novas, forçar o cérebro a criar novas conexões, manter um ofício/trabalho, disciplina, entre outros. A fisioterapia também é bastante utilizada tanto para casos em que a cognição é afetada, quanto para melhorar dores nas articulações. Mas cada caso é um caso.
A fisioterapeuta Katryne Holanda Silva, orientadora de prática dos estágios de fisioterapia do CEUB, ressalta que o tratamento deve ser feito de forma extremamente individualizada. “Depende muito de como o paciente está e quanto tempo ele ficou internado em uma em terapia intensiva ou hipoativo em cima de um leito. Depende do quadro físico inicial deste paciente, se é um jovem, se é um idoso. Depende também do biotipo do paciente, se ele é obeso ou não, pra gente prescrever os melhores exercícios”, pontua.
De forma geral, pacientes com quadro de dores nas articulações necessitam de alongamentos tanto para membros do corpo em geral, como também para os membros superiores, principalmente para favorecer a caixa torácica e a expansibilidade torácica. “A gente também tem que trabalhar bastante a cinesioterapia com o paciente, mantendo ele, ou pelo menos tentando manter, e devolvendo a ele a funcionalidade, ou seja, a sua qualidade de vida através das suas atividades de vida diária”, recomenda Katryne.
*Fonte: GPS/SAÚDE